Estado Regulador : O que é e como surgiu.

Ao decorrer da história da organização administrativa da sociedade, o papel do Estado vem mudando para acompanhar e atender as demandas comportamentais do mercado e prover o bem-estar social. As Guerras Mundiais e crises decorrentes por sua vez motivaram mudanças significativas no mercado e no comportamento da sociedade. Atualmente, o Estado também deve contar com a interferência da globalização no caminhar do mercado interno, já que as decisões econômicas e políticas que são tomadas por países influentes no mercado internacional se tornam decisivos no funcionalismo da economia interna, sendo sentidos macroeconomicamente no país. De um Estado Absolutista (caracterizado por ser paternalista, conservador e autoritário) passamos para um Estado Liberal, com um mercado livre e que se regulava a si próprio sem qualquer interferência estatal. Posteriormente, foi constituído o Estado Democrático de Direito, estabelecido no exercício da democracia e participação cidadã, protetor das garantias fundamentais e atuante através das leis.
Em detrimento da crise interna, outro cenário surge e fomenta a mudança da atuação do Estado: nos deparamos com a crise fiscal e assim, o Estado viu-se enfraquecido financeiramente tornando-se ineficiente, já que acentuo a limitação da sua produção de bens e serviços. Consequentemente, em virtude da insuficiência dos serviços oferecidos, falta de provimento das necessidades da sociedade e insatisfação com a Administração Pública, o Estado como agente produtor deu espaço para a ascensão do Estado como agente regulador, passando a atuar por meio da intervenção indireta sobre o mercado ao abrir espaço para a atuação da iniciativa privada na realização de serviços públicos.

Afinal, o que é o Estado Regulador?

O Estado passou a não deter a autonomia laboral de todos os serviços pois isso se tornou economicamente inviável e consequentemente abriu espaço para a atuação da iniciativa privada. Assim entra em cena o Estado Regular, que visa ser o equilíbrio entre a participação do cidadão para tomada de decisão e o incentivo à livre iniciativa (Mattos, 2006). No Estado Regulador a iniciativa privada também atua como produtor das tarefas econômicas e sociais, mas diferente do Liberalismo, há aumento do poder de controle, fiscalização e normatização das atividades privadas por parte do Estado; este orientado à proteção e satisfação dos interesses públicos.

As concessões de serviços que são feitas por parte do Estado não o abstém de fiscalizá-las e regulamentá-las. Tais ações estão previstas na Constituição Federal Brasileira de 1988, pois é o responsável pela defesa dos interesses da sociedade. Conforme define Furtado (1987), o papel do Estado como protagonista na regulação da Economia é garantir o bem-estar social, equalizar a concorrência e equilibrar o mercado. Instituições Reguladoras fortalecidas são essenciais para a garantia de um mercado justo.

Estado Regulador Brasileiro

O Brasil teve sua industrialização tardia por meio do governo paternalista de Getúlio Vargas (1930-1945) criando empresas estatais voltadas ao desenvolvimento industrial; estas vinculadas à uma nova maneira da burocracia regular a economia (Cardoso, 1973). Consequentemente, o desenvolvimento econômico gerado pela industrialização foi atrelado às empresas estatais e ao Estado, que atuou por meio da articulação entre capital estatal e capital privado (Furtado, 1964). Diferente do ocorrido nos Estados Unidos e Europa, a transição do Estado Liberal para o Estado Regulador não foi estabelecida através da luta de classes e insatisfação popular. No Brasil não houve conflito social e os seus protagonistas foram os grupos dominantes que controlavam o poder político e a máquina estatal:  tecnocratas, elites locais e multinacionais (Cardoso, 1973).

O autoritarismo no Brasil é contextualizado através das políticas populistas, ausência da representatividade popular e exercício político realizado estritamente pelas classes dirigentes e associadas. Este modelo de Estado regulador organizou-se através de uma burocracia que pouco escutava as demandas da sociedade civil e partia pelos interesses desse círculo político que tinha acesso aos canais de comunicação com os formuladores de políticas públicas, sendo este o instrumento utilizado para garantir os interesses de tais grupos políticos e econômicos (Furtado, 1974). Essa situação agravou-se ainda mais durante a Ditadura Militar, que aconteceu entre 1964 a 1985 (Fiori, 2003).

Com a redemocratização surge um novo modelo de Estado Regulador; caracterizado pela criação de agência reguladoras independentes, privatização de empresas estatais, regulação da economia baseada na defesa da concorrência, correção de falhas de mercado e pela terceirização da Administração Pública. O fim da Ditadura Militar trouxe consigo a descentralização do poder do Presidente da República (que no Brasil acumula as funções de chefe de Estado e chefe de Governo) e de seus ministros (Fiori, 2003). Contudo, também foram desenvolvidos novos mecanismos para fomentar a participação da sociedade civil na formulação regulador de setores da economia. As agências reguladoras no Brasil são autarquias federais que foram criadas desde 1997, após o programa de privatizações de estatais promovido no primeiro governo FHC (1995-1998). A reforma do Estado Regulador na década de 1990 não eclodiu apenas pela crise fiscal, a visto que foi principalmente a partir da demanda por transformação e mudança da burocracia vigente alicerçada por um movimento intelectual e pela eleição direta de Fernando Henrique Cardoso para presidente (Coelho & Nobre, 2004).

De acordo com os autores, com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, a função reguladora do Estado ganha mais um capítulo. Assim que foi eleito, Lula anunciou: "O Brasil foi terceirizado. As agências mandam no país. [...] as decisões que afetam a população não passam pelo governo". O que gerou uma grande repercussão midiática e dentro do congresso. Ao contestar a forma estabelecida de agências reguladoras independentes, Lula direcionou sua crítica ao aumento nas tarifas públicas de energia elétrica e telefonia. Os ministros de Minas e Energia e de Comunicações dialogaram com os dirigentes das agências e amenizaram as críticas, ainda que afirmassem a necessidade de fortalecimento dos seus ministérios.

Em meio à fase crítica, houve intervenção dos Ministérios nos setores, como no caso da redução do aumento da tarifa de energia elétrica por parte do Ministério de Minas e Energia. Entretanto, com a insuficiência dos Ministérios em relação à estrutura e capacitação técnica, foi constatado a inviabilidade destes em realizar os serviços prestados pelas agências reguladoras; assim, houve a redução das críticas por parte do Governo Lula, embora o desejo por mudanças na relação entre agências e governo permanecesse.

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